A ocorrência de multimorbidades em idosos é uma condição comum na perspectiva da saúde, caracterizando-se pela presença de duas ou mais doenças crônicas em indivíduos acima de 60 anos.1 O surgimento de feridas nesse público possui incidência aumentada, relacionando-se a elementos extrínsecos à pessoa idosa, como exposição térmica, atrito e fricção da pele, e intrínsecos, como diminuição da hidratação tópica e da espessura dos tecidos superficiais.2 Nesse sentido, torna-se fundamental a atenção a idosos com lesão, com busca por terapias assertivas que diminuam o período de cicatrização, promovendo maior funcionalidade ao idoso. Uma opção terapêutica adjuvante é a Oxigenoterapia Hiperbárica (OHB), que consiste na administração de oxigênio com nível de pureza próximo a 100%, em um ambiente de pressão duas a três vezes superior ao do nível do mar, promovendo uma maior dissolução do oxigênio no plasma sanguíneo, consequentemente permitindo uma maior perfusão tecidual, redução de edema e de níveis de citocinas inflamatórias, com estímulo a proliferação de fibroblastos e maior produção de colágeno, além de otimizar a função de células leucocitárias, fatores essenciais para a cicatrização de feridas.3 Curativos de gaze impregnada com Polihexametileno de Biguanida (PHMB), por sua vez, podem contribuir na cicatrização por sua ação antimicrobiana efetiva, além de boa tolerabilidade tecidual quanto a substância e bom manejo do exsudato, sendo indicado para feridas exsudativas e colonizadas.4 Dessa forma, com a combinação de diferentes terapias, é possível abreviar o tempo de cicatrização e aumentar a qualidade de vida da pessoa idosa com ferida.
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Paciente do sexo masculino, 78 anos, residente de zona rural, portador de diabetes tipo II insulinodependente, hipertenso, dislipidêmico e polifarmácia, com história de trauma por arranhadura no local de trabalho com uso de bota, evoluindo com erisipela em face lateral de perna esquerda, passando por procedimento de desbridamento e drenagem de abcesso. Na admissão, apresentou duas lesões de aspectos biológicos semelhantes, com exposições de tecidos nobres, leito granulado, ilhas de fibrina, biofilme bem aderido, com presença de tecido necrótico em periferia superior; drenando exsudato seropurulento; odor fétido leve; borda irregulares e fragilizadas; perilesão desidratada com sinais flogístico presentes. Equipe multidisciplinar optou por utilização de cobertura com gaze impregnada com PHMB com o objetivo de absorver o exsudato, além de promover eficiente ação antimicrobiana local, estimulando o processo cicatricial, sendo realizada troca de curativo três vezes por semana. Cultura de fragmento coletada no 9º dia de tratamento evidenciou Staphylococcus aureus resistente à meticilina e Acinetobacter baumannii multirresistente. Médica infectologista da equipe solicitou internamento por 10 dias para administração intravenosa de polimixina e vancomicina, com monitoramento da função renal a cada três dias para reavaliação da dose administrada. Após cerca de um mês e meio de tratamento, iniciou-se sessões de OHB em períodos de 90 minutos sob pressão de 2,5 atmosferas absolutas (ATA), sob prescrição da médica clínica geral da equipe, devido ao estímulo à neoangiogênese e consequentemente à granulação, além da ação antimicrobiana do oxigênio hiperbárico, evitando maiores complicações. Paciente evoluiu favoravelmente com a troca de curativos e realização das sessões de OHB, apresentando cicatrização completa de lesão de menor dimensão, enquanto lesão maior exibiu, após 3 meses de tratamento, leito com granulação hipocorada e biofilme impregnado, exsudato seropurulento de coloração esverdeada e odor característico, mantendo borda irregulares e perilesão fragilizada. Dosagem sérica de hemoglobina glicada realizada no início do 6º mês de tratamento revelou um percentual de 9,0%, extrapolando a meta prevista de menos que 7,5% para idosos saudáveis,6 necessitando de intervenção de médica clínica da equipe com prescrição de metformina e aumento da dose de insulina aplicada diariamente, com resultados positivos ao 7º mês, no qual o percentual de hemoglobina glicada sérica do paciente foi de 6,9%. O paciente recebeu alta após cerca de 7 meses de cuidado, apresentando lesão totalmente epitelizada, sem retorno de exsudato ou necessidade de oclusão. Foram realizadas 41 sessões de OHB durante o tempo de tratamento, sem intercorrências. O paciente e sua acompanhante mostraram grande satisfação com a cicatrização completa da lesão, com melhora efetiva na deambulação, elemento fundamental para o envelhecimento saudável, sobretudo em idosos com multimorbidades, reduzindo a chance de ocorrência de quedas e promovendo maior qualidade de vida.