A incidência de queimadura em crianças é um grave problema de saúde em todo o mundo. Os principais fatores de risco associados a esse agravo são o baixo acesso à informação dos genitores, idade da criança inferior a 4 anos e a falta de supervisão adequada, sobretudo quando há fácil acesso à cômodos de maior risco de acidentes na residência, como a cozinha.1 Nessa perspectiva, é evidente que o público infantil necessita de um tratamento individualizado, com a atuação de uma equipe multiprofissional, com o objetivo de obter o melhor resultado possível em tempo hábil.2 Como cobertura, a utilização de malha não aderente com prata iônica reduz com efetividade a presença de crostas e traumas durante a troca de curativo, além de estimular a granulação, apresentando vantagem terapêutica sobre a utilização de creme de sulfadiazina de prata 1% no tratamento de feridas, com trocas em maior intervalo de tempo (4 a 7 dias) e menos traumáticas, reduzindo o estresse do paciente e da equipe profissional.3 Como tratamento adjuvante, a Oxigenoterapia Hiperbárica (OHB) é uma possibilidade com eficácia amplamente comprovada por meio de estudos científicos para o tratamento de queimaduras, com a redução da inflamação e preservação da derme.4 Tal terapia ocorre pela administração de oxigênio em alto nível de pureza em um ambiente com pressão de duas a três vezes maior que o nível do mar, promovendo maior dissolução do oxigênio no plasma, consequentemente aumentando a oxigenação dos tecidos.5 De maneira sinérgica, tais terapias podem ser implementadas para otimizar o processo cicatricial.
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Método: Este relato de caso foi estruturado com base no CARE case report guideline e realizado por revisão de prontuário, entrevista com o paciente e registro fotográfico da lesão ao longo do tratamento, as informações coletadas foram consentidas pela pessoa responsável pela paciente através de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.6
Resultados: Paciente do sexo feminino, 1 ano e 7 meses, previamente hígida, foi admitida no serviço de integridade cutânea e prevenção de agravos acompanhada por seus genitores, com história de queimadura térmica de 2º grau extensa em de face, região anterior de pescoço e tórax decorrente de acidente doméstico com chá quente há 1 dia, sendo tratada inicialmente com sulfadiazina de prata, mantendo quadro álgico importante mediante a escala de dor facial. Na admissão, paciente apresentou-se chorosa, pouco colaborativa, extensa área de desnudação cutânea e exposição da derme, flictenas rotos, leito granulado com pontos de fibrina, exsudativa de aspecto serosanguinolento, bordas irregulares, mal delimitadas, com perilesão hiperemiada e fragilizada. Equipe multidisciplinar optou por utilização de cobertura com malha não aderente impregnada com prata iônica por sua ação bactericida e troca de curativo pouco traumática. Para a redução do estado inflamatório e prevenção de infecções, médica infectologista da equipe receitou prednisolona 7,5mg a cada 12 horas via oral por 5 dias e amoxicilina com clavulanato 640+91,2mg via oral a cada 12 horas por 7 dias. Como tratamento adjuvante, iniciou-se sessões diárias de OHB com 90 minutos sob pressão de 2,5 atmosferas absolutas (ATA) com o objetivo de reduzir hiperemia, edema, rubor e demais sinais flogísticos, prevenir infecções por meio da otimização do sistema imunológico, além de estimular a atividade fibroblástica, com maior produção de colágeno e aceleração do processo cicatricial. No 8º DT, paciente apresentou melhora significativa da lesão. Durante avaliação de enfermagem, evidenciou-se leito esboçando epitelização com ilhas de granulação próximo à cicatriz umbilical e hipocôndrio esquerdo, exsudato moderado de aspecto serossanguinolento, bordas irregulares, região perilesional com sinais inflamatórios em redução. No mesmo dia, médica clínica da equipe solicitou alta da OHB, prosseguindo com o uso de curativos especiais até a reepitelização completa da região acometida, totalizando 8 sessões.
Discussão: Em comparação aos adultos, a ocorrência de queimaduras em crianças possui gravidade maior, mesmo que em mesma proporção, tendo em vista que produzem respostas metabólicas mais intensas em quase todos os órgãos e sistemas.7 Nesse contexto, conter a reação inflamatória produzida pela queimadura é fundamental para recuperar a integridade tecidual o mais rápido possível e evitar maiores danos. Para tanto, a utilização de curativo de malha não aderente impregnada com prata combinada com a realização de sessões de OHB encaixaram-se devidamente nas necessidades específicas da paciente, como a prevenção de traumas durante trocas de curativo, o combate a infecções, aliando o uso do antibiótico à prata tópica e ao oxigênio hiperbárico, além de proteger o leito e estimular o processo de regeneração tecidual por intermédio da maior produção de colágenos pelos fibroblastos. Em adição aos benefícios à paciente já citados, é necessário destacar os efeitos positivos da cicatrização da lesão para os pais da criança, haja vista que o processo de lesão e busca por tratamento gera sofrimento entre os familiares, o que logo é substituído por satisfação ao se deparar com o cuidado e dignidade que a criança recebe, aumentando a responsabilidade sobre o profissional de saúde em fornecer o tratamento de maneira acolhedora e respeitosa em tempo hábil, a fim de corresponder às expectativas que os genitores possuem.8
Conclusão: Portanto, evidencia-se que a utilização de curativo com malha não aderente impregnado com prata iônica associado à OHB adjuvante possivelmente contribuiu para o rápido processo de cicatrização na paciente, em conjunto com o cuidado da equipe multidisciplinar em saúde, gerando efeitos positivos não só à paciente, como também aos seus familiares.