A via intramuscular para injeções é amplamente utilizada devido a rápida absorção de substâncias e facilidade de acesso. No entanto, características do paciente e da medicação ou a falta de conhecimento do profissional acerca da técnica correta podem ocasionar complicações como a formação de abcessos, eritema, embolias e lesão nervosa.1 Para o tratamento a enfermidade, pode-se utilizar como terapia adjuvante a Oxigenoterapia Hiperbárica (OHB), que consiste na administração de oxigênio puro em um ambiente de alta pressão, promovendo maior dissolução de oxigênio no plasma sanguíneo com aumento da perfusão sanguínea, redução de sinais inflamatórios, maior angiogênese e produção de colágeno.2 Como cobertura, uma opção eficiente é o alginato de cálcio, indicado para feridas cavitárias, sangrantes ou de alto volume de exsudato devido seu potencial absortivo e hemostático causado pelos íons cálcio, além de desbridamento do tecido inviável.3 Uma alternativa é a gaze impregnada com Polihexametileno de Biguanida (PHMB), uma vez que possui amplo espectro de ação contra bactérias, além de excelente manejo do exsudato, possuindo indicação semelhante a do alginato de cálcio.4 Em conjunto, tais medidas terapêuticas podem ser utilizadas para otimizar o processo de cicatrização.
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Método: Este relato de caso foi estruturado com base no CARE case report guideline e realizado por revisão de prontuário, entrevista com o paciente e registro fotográfico da lesão ao longo do tratamento, as informações coletadas foram consentidas pelo paciente através de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.5
Resultados: Paciente mulher, 24 anos, previamente hígida, admitida pelo serviço de integridade cutânea e prevenção de agravos em uso de amoxicilina com clavulanato com história de abscesso em glúteo esquerdo proveniente de aplicação intramuscular de medicação anti-inflamatória (diclofenaco e cetoprofeno) em farmácia. Devido à infecção causadora do agravo, a paciente necessitou de internamento hospitalar para antibioticoterapia venosa e desbridamento local. Na admissão, apresentou lesão de grande extensão, leito parcialmente cavitário, recoberto por tecido fibrinoso, bem aderido ao leito, com pequenas ilhas de granulação, drenando exsudato serossanguinolento em moderado volume, sem odor, bordas irregulares e fragilizadas, perilesão edemaciada e dor à manipulação. Equipe de enfermagem iniciou curativo de alginato de cálcio devido seu potencial de desbridamento de tecido inviável, estímulo à granulação e absorção de exsudato. No 35º dia de tratamento (DT), paciente iniciou a OHB em sessões de 90 minutos sob pressão de 2,5 atmosferas absolutas (ATA) como tratamento adjuvante, por prescrição médica, devido ao aumento da microvascularização e à ação antimicrobiana promovida pelo oxigênio hiperbárico. Um dia após o início das sessões, avaliação de ferida evidenciou redução das bordas da lesão e de sua profundidade, além de predominância do tecido de granulação, mantendo ilha de fibrina em periferia, com bordas bem delimitadas, porém ainda drenando exsudato em grande quantidade, com dor à manipulação. No mesmo período, equipe de enfermagem optou por substituir conduta anterior por curativo de gaze impregnada com PHMB, por sua alta absorção de exsudato, estímulo à granulação, desbridamento de tecido inviável, além de ação antimicrobiana. No 107º DT, lesão apresentava-se totalmente epitelizada, ausente de exsudato e sinais inflamatórios, não sendo mais necessário curativos especiais. Foram realizadas 18 sessões de OHB ao longo do tratamento. Paciente recebeu alta com orientação de utilizar creme hidratante com alta concentração de dexpantenol duas vezes por dia, em topografia de cicatriz e região adjacente, a fim evitar novos agravos.
O caso em questão é um exemplo infrequente de complicação grave decorrente de aplicação medicamentosa por via intramuscular. Tal situação levanta reflexões acerca da falta de conhecimento acerca da técnica entre os profissionais capacitados e não capacitados que comumente administram fármacos em hospitais, farmácias e postos de saúde. Nessa perspectiva, torna-se necessário que os serviços de saúde exijam que profissionais devidamente habilitados realizem o procedimento, a fim de evitar desfechos negativos.6 Quanto a evolução da paciente, é notório o curto tempo de tratamento, haja vista que houve cicatrização completa de uma ferida cavitária de grande extensão em um período de 3 meses e meio. Um ponto essencial para a abreviação do tempo de cicatrização foi a utilização de curativos especiais com a característica principal de manejo do exsudato, além de desbridamento de tecido inviável e estímulo a granulação, elementos que se enquadram nas necessidades da paciente com uma lesão profunda, com tecido necrótico e esfacelo em leito e bordas fragilizadas. Em ação complementar, a OHB pode ter amplificado o estímulo cicatricial na lesão devido à alta capacidade de perfusão do oxigênio hiperbárico em capilares que a hemácia não é capaz de alcançar devido seu tamanho celular, com um aumento em até 10 vezes de sua forma dissolvida no plasma, o que aumenta o aporte de oxigênio no tecido epitelial, otimizando a função de fibroblastos, com consequente aumento na síntese de colágeno, além de aumento da função antimicrobiana das células,7 sendo fundamental para uma paciente com lesão de grande extensão com tecido fibrinoso em leito. Em conjunto, tais medidas terapêuticas atuaram em conjunto para o sucesso do tratamento.
Conclusão: Conclui-se que a OHB pode ter contribuído para o desfecho positivo do caso relatado em conjunto com coberturas especiais escolhidas de acordo com as necessidades da paciente, o que reforça a importância do acompanhamento avançado de pacientes com feridas complexas, sobretudo após desbridamento de grande extensão ou internamento, além de refletir a importância da técnica correta da administração intravenosa de medicamentos a fim de evitar complicações como a descrita no caso.